23 de jun. de 2011

Dopping intelectual: alunos usam remédios para suportar maratona do vestibular

Potencial dos medicamentos para tratamentos de Déficit de Atenção no rendimento dos estudos é ilusório. Conheça os riscos e os efeitos colaterais 

A menos de seis meses da maratona de prova dos principais vestibulares do País o ritmo de estudo ganha ainda mais velocidade. Qualquer brecha no tempo é dedicada aos livros, aos exercícios de matemática, português, química, biologia, história ou física. Não dá para dormir no ponto. E para dar conta do conteúdo programático de três anos em apenas 180 dias, muitos estudantes optam pelo Dopping Intelectual com o uso ilegal de remédios para tratamentos de Déficit de Atenção

Como é o caso do estudante de Campinas (SP), Pedro (nome fictício), 19 de anos, que dedica grande parte dos seus dias a missão de ingressar no curso de medicina. Embora ele reconheça que o remédio não aumente sua inteligência, enfatiza seu potencial no rendimento dos estudos. Com o remédio o aluno consegue estudar até 2h, mesmo acordando às 6h para frequentar as aulas do pré-vestibular. "Consigo ficar 'ligado' por muito mais tempo. Assim estudo mais e faço mais exercícios", relata ele.
 
É essa promessa de melhora nas capacidades de concentração e memorização, associadas à redução do cansaço e do sono, que tem induzido muitos estudantes, assim como Pedro, a recorrerem a substâncias como o metilfenidato (comercializada com o nome de Ritalina). O próprio efeito colateral do medicamento - a insônia - atrai os vestibulandos. E mesmo diante da restrição da comercialização do medicamento, as vendas do remédio cresceram 1.500% entre 2000 e 2008.
 
Mas os efeitos do consumo indevido do remédio destinado para pacientes com Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), segundo o professor de Neurologia da Universidade Federal de São Paulo, Paulo Henrique Ferreira Bertolucci, são ilusórios. "A substância é utilizada para recompor a alteração química no cérebro das pessoas com o transtorno. Se não há o déficit, as melhoras no rendimento são pequenas e algumas vezes até imperceptíveis", garante o médico.
 
Além de não alcançar o resultado desejado, o estudante pode ainda ser surpreendido com os efeitos colaterais. E ao invés da concentração, terá que se contentar com a sonolência, além da dor de cabeça, dor abdominal, náuseas e vômitos. O uso prolongado do remédio pode desencadear problemas ainda mais sérios como crises de ansiedade e stress profundo. "Em casos mais raros, pode induzir ou piorar tiques e até causar convulsões", acrescenta Bertolucci.
 
Diante de todos esses riscos, o Diretor Pedagógico do colégio Oficina do Estudante, Célio Tasinafo, recomenda que os estudantes evitem tomar qualquer medicamento sem a prévia prescrição de um especialista. "Não dá para o aluno achar que vai superar seus concorrentes a partir do uso de substâncias, como o metilfenidato", ressalta. De acordo com ele, a medida pode causar prejuízos enormes e inviabilizar o principal sonho do estudante: o ingresso na universidade.
 
Recomendação que o estudante Thiago (nome fictício), 22 anos, vivenciou na pele. Ele afirma ter ficado entusiasmado com o uso do remédio no início. "Estudava bastante, tinha disposição para ir a baladas, fazer simulados e ir às aulas no dia seguinte", relata. Mas com o tempo, a disposição se transformou em irritação. "Ficava acordado, mas nenhuma atividade rendia", conta ele, que decidiu abandonar o uso do remédio, mas o cansaço mental e o stress acabaram dificultando seu ingresso no curso de Arquitetura.
 
Portanto, para conseguir dar conta da pressão do vestibular é preciso investir nos estudos, mas não descuidar da saúde. "Muito melhor do que tomar Ritalina é ter uma boa noite de sono", orienta Bertolucci.